Arbitragem explicada (e sem juridiquês)
Imagine que você entrou em uma sala e para ir até onde você quer chegar existem várias portas (1). Assim é o sistema de justiça brasileiro, também conhecido como multiportas. Você quer chegar à Justiça e são vários os caminhos à disposição, um deles é a arbitragem.
Arbitragem é um instituto por meio do qual as pessoas indicam um terceiro para resolver seus conflitos.
Arbitragem é, ou seja, um dos métodos de resolução de conflitos que serve como alternativa ao Poder Judiciário. Usualmente, quando existe algum desentendimento em que as partes não conseguem entrar em um acordo sobre como resolver, os envolvidos contratam advogados e estes, por sua vez, ingressam com ações judiciais.
A arbitragem é uma alternativa legítima e reconhecida por legislação internacional e nacional como um dos métodos adequados de solucionar disputas. Isto é, quando as partes e os advogados entendem vantajoso não iniciar um processo no Judiciário, mas o substituir pelo processo arbitral.
Dados recentes da pesquisa Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça sobre o Poder Judiciário mostram que o tempo médio para a primeira sentença, ou seja, na 1º instância, antes de qualquer recurso é de 3 anos e 11 meses. Enquanto na 2º instância, com todos os recursos, chega a quase 3 anos.
Neste cenário é quase impossível acreditar que “Justiça tarda mas não falha”, pois justiça que tarda, falha sim. Então, a arbitragem surge como solução.
“O campo para se semear a arbitragem interna ainda é vastíssimo, principalmente na perspectiva de se popularizar, ou melhor, democratizar a arbitragem.” (2)
Francisco José Cahali
A arbitragem já vêm sendo muito utilizada no Brasil principalmente em causas muito complexas e com valores expressivos. Hoje, no entanto, com a necessidade de buscar alternativas ao Poder Judiciário, dirige-se o olhar para a arbitragem mais acessível a todos: a arbitragem “social” ou “democrática”.
“Sadia a experiência internacional, com frutíferos resultados, aliados aos dissabores pela vagarosa máquina do Judiciário, esta técnica de solução de conflitos passou a ser atraente para grandes questões jurídicas de natureza privada. Além disso, a arbitragem apresenta-se como um foro neutro para disputas internacionais.” (3)
Francisco José Cahali
A autonomia das partes é um dos princípios fundamentais que resguarda a legitimidade e a flexibilidade do procedimento arbitral. Deste modo, as partes que concordam em utilizar a arbitragem, seja com uma cláusula compromissória ou com compromisso arbitral, estão obrigadas a resolver qualquer conflitos que entre elas venha a surgir por meio de arbitragem.
Sendo assim, as partes podem escolher vários detalhes do procedimento, o que não é possível no Poder Judiciário. A seguir menciono algumas das possibilidades:
- Os prazos. O art. 23 da Lei 9.307/1996 (Lei de Arbitragem) prevê que o julgamento deve ocorrer em 6 (seis) meses, mas porque as partes têm autonomia elas podem escolher outro prazo que queiram.
- As manifestações. As partes podem definir qual vai ser a quantidade e a sequência das manifestações.
- O idioma em que o processo vai ser conduzido.
- A lei. Caso o conflito seja internacional, as partes podem selecionar que o Direito Italiano, por exemplo, sirva de fundamento para a decisão. Interessante, ainda, que as partes podem, inclusive, escolher a possibilidade de julgamento por equidade.
- A instituição arbitral e os árbitros. As Câmaras Arbitrais possuem suas listas de árbitros. De todo modo, algumas não restringem a indicação dos árbitros àqueles componentes da lista. A Arbi-ON tem sua lista de árbitros extremamente competentes mas não por isso impede que usuários indiquem árbitros externos.
- O local. Não é necessário nem mesmo um local físico, ou seja, interpreta-se “local” de maneira ampla, podendo ser uma plataforma online.
Estas e outras características ficam a critério de escolha das partes e podem ser definidas em três momentos: a) na cláusula compromissória do contrato; b) no compromisso arbitral; ou c) no Termo Arbitral, após a solicitação da arbitragem pelo Requerente e o aceite por parte do Requerido.
O art. 31 da Lei 9.307/1996 (4) e o art. 515, inciso VII do CPC (5) conferem à sentença arbitral o mesmo valor jurídico e eficácia que uma sentença judicial, tornando-a título executivo judicial. Ainda, as decisões na arbitragem são definitivas, não cabendo recurso. A única possibilidade que se assemelha a recurso é o pedido de esclarecimento, no entanto não se revisa o mérito, somente erros de digitação, omissão ou obscuridade.
Importante analisar as peculiaridades de cada caso para selecionar qual o método de solucionar conflitos mais adequado e, para isso, recomenda-se o auxílio de um advogado, embora não haja obrigatoriedade na presença deste profissional durante o procedimento.
Luiza Adena Engers
Founder da Arbi-ON. Advogada em Direito das Startups e Empresarial.
Fontes:
(1) A consagrada expressão multi-door courthouse foi originalmente usada pelo Prof. Frank Sander (Harvard) em 1976, em conferência que posteriormente veio a ser publicada em 1979: Frank Sander. Varieties of dispute processing, Minnesota: West Publishing, 1979, pp. 65/87.
(2) CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem. Rev. dos Tribunais, 2018. 6º edição. p.12.
(3) CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem. Rev. dos Tribunais, 2018. 6º edição. p.10.
(4) Art. 31. A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo.
(5) Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: (…) VII – a sentença arbitral.